Acordo coletivo só pode reduzir direitos se houver compensação
“As negociações coletivas, para que sejam aptas à transação
de direitos dos trabalhadores, hão de demonstrar uma ‘comutatividade
mínima’ dentre suas normas, de modo que a redução de um
direito trabalhista implique, forçosamente, uma contrapartida
que lhe seja proporcional”. Com essa argumentação, invocando
o princípio da razoabilidade e proporcionalidade, a 2ª Câmara
do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região deu provimento
ao recurso de um trabalhador, em processo movido contra
uma empresa de agronegócios. A votação foi unânime.
Na primeira instância, a Vara do Trabalho de Orlândia,
município a 288 quilômetros de Campinas, na Região de Ribeirão
Preto, julgou improcedente a reclamação, confirmando a validade
do acordo coletivo que instituiu a jornada de trabalho em
turnos ininterruptos de revezamento, mas manteve o cálculo
da remuneração das horas trabalhadas com base no divisor
220 - a Constituição Federal de 1988 fixa o divisor 180
para jornadas cumpridas dessa forma. No recurso, o reclamante
pleiteou a desconsideração do pacto, de forma a serem decretadas
como extras todas as horas trabalhadas além da sexta diária.
Reciprocidade
A relatora do acórdão no TRT, desembargadora federal do
trabalho Mariane Khayat, ressaltou a legitimidade conferida
às convenções e acordos coletivos de trabalho pela Constituição
Federal, como está explícito em dois incisos do artigo 7º,
o XIV, que faz referência direta à possibilidade de se negociar
a duração da jornada de quem trabalha em turnos ininterruptos
de revezamento, e o XXVI. No entanto, essa validade, observou
a magistrada, presume que as negociações resultem em ganhos
para os trabalhadores, e não o contrário. É uma condição
expressamente disposta no caput do mesmo artigo 7º, lecionou
Khayat. “Os direitos que [o artigo] enumera são devidos
além de outros que visem à melhoria da condição social do
trabalhador”, sublinhou a relatora, assinalando também que
“o inciso de qualquer artigo legal está vinculado ao seu
caput”.
“As negociações coletivas (...) não podem renunciar sobre
direito de terceiro”, advertiu a desembargadora. “Cabe-lhes,
apenas e tão-somente, por meio de concessões recíprocas,
instituir regras de execução do contrato de trabalho que
respeitem o piso mínimo vital do trabalhador.” Para a magistrada,
não pode ser aceito como válido um acordo coletivo “que
seja elaborado somente com a finalidade de majorar jornada
de trabalho constitucionalmente regulamentada (seis horas
para o trabalho em turnos ininterruptos de revezamento),
porque esbarra não só nos limites constitucionais impostos
aos acordos e convenções coletivas, mas também no próprio
conceito de transação, que envolve, necessariamente, concessões
recíprocas”.
Khayat acrescentou ainda um agravante à situação discutida
no processo. “O direito transacionado tem influência direta
e imediata na saúde do trabalhador”, alertou ela. “O aumento
da jornada de trabalho nesses casos há de ser compensado
com algum ganho a esse indivíduo, preferencialmente algo
que lhe proporcione um valor de mesma grandeza daquele perdido
pelo extenuante trabalho em turnos”, concluiu a desembargadora.
Assim, a Câmara modificou para procedente em parte a decisão,
condenando a empresa a pagar ao reclamante como extras as
horas excedentes à sexta diária e à trigésima sexta semanal,
com reflexos, além de diferenças de adicional noturno e
de adicional de periculosidade, entre outras verbas.
Fonte: TRT-15R