Início de gestão Richa repete o governo Lerner
O jornal Gazeta do Povo publicou no caderno “Vida Pública” da edição deste domingo (13.02.2011) uma reportagem apontando as muitas semelhanças entre o início do mandato do atual governador Beto Richa com o começo da gestão de Jaime Lerner. Leia abaixo a versão da matéria que está disponível no site da Gazeta do Povo e avalie.
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Qualquer semelhança não é mera coincidência. O governador eleito do Paraná recebeu o cargo das mãos do vice-governador do estado, provisoriamente no poder após o governador eleito, Roberto Requião (PMDB), ter renunciado ao mandato para disputar uma bem-sucedida campanha ao Senado Federal.
Como vinha de duas administrações muito bem-avaliadas na prefeitura de Curitiba, em seu discurso de posse o novo governador prometeu levar a estrutura e alguns projetos de destaque da administração municipal para a esfera estadual. Com as palavras de ordem “mudança e modernização”, o governador prometeu “revolucionar o Paraná” e tirá-lo do atraso após administrações seguidas do PMDB.
Na composição do primeiro escalão, os cargos considerados estratégicos no governo foram entregues a políticos da base aliada que representassem as diversas regiões do estado que lhe garantiram os votos necessários à eleição.
O governador, por exemplo, nomeou Cássio Taniguchi, com quem já trabalhara na prefeitura de Curitiba, como secretário de Planejamento. Criou também uma Secretaria da Criança e da Família – para a qual nomeou a própria mulher. E nomeou amigos e pessoas muito próximas para outros cargos – sendo que alguns nomes controversos geraram polêmica.
O novo governador não escondia ainda que sua intenção era fazer uma reforma administrativa. Mas, antes, precisou lidar com a sucessão da Mesa Diretora na Assembleia Legislativa. O maior problema estava em acomodar os interesses da bancada do PMDB, a maior da Casa, sem ferir os brios dos partidos aliados. Uma mexida equivocada neste xadrez político poderia lhe criar obstáculos à governabilidade logo no início do mandato.
O texto acima é o resumo do início do mandato do ex-governador Jaime Lerner, então no PDT, em 1995. Poderia, porém, descrever perfeitamente o início da gestão Beto Richa (PSDB) como chefe do Executivo paranaense.
O início da gestão Richa guarda várias semelhanças com o período em que Jaime Lerner foi governador do Paraná (de 1995 a 2002), tanto na agenda política como na escolha da equipe e nas alianças – embora na campanha eleitoral do ano passado o atual governador tenha rechaçado por várias vezes a “acusação” de seu principal adversário, Osmar Dias (PDT), de que ele era um “lernista”.
Durante o calor das discussões eleitorais, Lerner chegou a emitir um atestado de não lernista para Richa e para Osmar, em tom de brincadeira. Talvez o ex-governador hoje tivesse de rasgar o diploma de Beto. Afinal, muitos nomes do primeiro e do segundo escalão do atual governo já tinham atuado no governo na época de Lerner (veja quadro ao lado).
Servidores públicos de carreira que conversaram com a reportagem (e pediram para não serem identificados) disseram que há um sentimento de que a “era Lerner” voltou. Nomes que estavam afastados dos cargos de chefia, durante os últimos oito anos, voltaram a assumir funções relevantes.
A principal medida anunciada até agora por Beto Richa como governador – o decreto que determina a redução de gastos de custeio nas secretarias – também encontra fortes semelhanças com uma medida tomada por Lerner no início de seu segundo mandato.
Logo após a reeleição, em janeiro de 1999, Lerner criou um Conselho de Reestruturação e Ajuste Fiscal (Crafe) que reunia as quatro secretarias e órgãos com grande poder – Administração, Fazenda, Planejamento e Governadoria. A ideia do Crafe era promover uma reforma administrativa no estado e a ordem de Lerner era para “apertar o cinto e evitar os gastos desnecessários”.
Estratégia parecida já havia sido usada por Richa na prefeitura de Curitiba e foi agora apresentada como o “choque de gestão” que o Paraná estaria precisando e que foi prometido na campanha. O decreto publicado pelo governo no último dia 3 de janeiro para fazer a atual reforma administrativa, por exemplo, contempla um conselho integrado pelos secretários das mesmas áreas que existiam na era Lerner, com a inclusão do procurador-geral, Ivan Bonilha.
A base política de apoio na Assembleia é outro ponto de semelhanças entre Richa e Lerner. O ex-líder do governo no Legislativo no período lernista, Valdir Rossoni, foi ungido por Beto para ser o novo presidente da Assembleia.
Para compor a direção da Casa, Rossoni escolheu pessoas que já trabalharam para Lerner, como Benoni Manfrin e Eduardo Paim. Além disso, parlamentares como Ademar Traiano (PSDB) e Durval Amaral (DEM), que compunham a “tropa de choque” de Lerner na Assembleia são aliados importantes de Beto. Traiano é líder do governo na Assembleia e Durval é o secretário-chefe da Casa Civil.
O cientista político Ricardo Costa de Oliveira, da UFPR, afirma que o começo da gestão Beto Richa representa uma retomada das ações e relações da administração Lerner. “São governos com a mesma agenda política e os mesmos atores políticos. Grande parte dos nomes do secretariado e dos conselhos das estatais são figuras marcantes do lernismo”, diz Oliveira. Ele lembra ainda que o próprio Beto foi o canditado de Lerner ao governo do estado em 2002. Para Oliveira, a retomada dessas relações revela uma face que o governador procurou esconder durante a campanha. Ele ressalta ainda que algumas políticas públicas que foram bandeiras do governo Lerner – como a atração de empresas estrangeiras com benefícios fiscais – devem ser retomadas na atual administração.
No início de seu segundo mandato, em 1999, o ex-governador Jaime Lerner tinha consolidado a imagem do político paranaense mais influente no país depois de muitos anos sem o estado ter um expoente nacional. Chegou a ser cotado como possível sucessor de Fernando Henrique Cardoso na Presidência. Porém, seguidas suspeitas de corrupção abalaram o prestígio de Lerner – que preferiu se afastar da política após o fim de seu governo.
A carreira ascendente do governador Beto Richa cria sobre ele uma expectativa semelhante, ainda que em menor escala, a que se tinha sobre Lerner: a possibilidade de uma nova liderança paranaense com relevância nacional. “Beto Richa é jovem e tem sucesso político precoce e condições de assumir um papel relevante em nível nacional”, avalia Alberto Carlos de Almeida, doutor em Ciência Política e autor do livro A Cabeça do Eleitor. Para Almeida, o governador precisaria aprender com os erros de Lerner. “Ele [Richa] precisa ter a inteligência política de evitar que o nível de irregularidades da ‘era Lerner’ se repita. Se evitar isso, ele pode sim despontar como uma nova força nacional.”
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Confira alguns nomes que estavam na gestão Lerner e reapareceram no governo Richa:
Imagens da versão impressa da matéria
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