1,6 milhão de inativos podem pedir a “desaposentadoria”
Aposentados que continuam trabalhando têm entrado com ações para
que o benefício leve em conta as novas contribuições
Os pedidos de “desaposentadoria”
se tornaram as ações mais comuns contra o Instituto Nacional
do Seguro Social (INSS). Elas são abertas por aposentados que
continuaram a trabalhar – e contribuir – após começarem a receber
o benefício do INSS, e pedem a revisão do cálculo da aposentadoria
para que seja levado em conta o novo período de contribuição.
De acordo com o Ministério da Previdência,
1,6 milhão de inativos continuam no mercado de trabalho e, em
tese, podem entrar com ações pedindo a revisão do benefício.
O risco de uma enxurrada de processos contra o INSS, portanto,
é grande, o que tende a contribuir para aumentar o rombo nas
contas do órgão caso os aposentados obtenham a revisão na Justiça.
Para o INSS, porém, não existe regulamentação que o obrigue a
fazer o novo cálculo.
Recentemente,
os tribunais superiores começaram a dar ganho de causa a inativos
em pedidos de desaposentadoria. A principal vitória individual
deste tipo foi confirmada em 23 de fevereiro pelo Superior Tribunal
de Justiça (STJ), mas há também decisões favoráveis nos Tribunais
Regionais Federais da 2.ª e da 4.ª Regiões.
A auxiliar de informática Neusa da Silva
Brandt, de 54 anos, recentemente deu entrada no processo de
desaposentadoria com expectativa de ter o mérito julgado até
o fim de 2013. Ela se aposentou há três anos e meio, mas continua
com um emprego formal, ou seja, contribui regularmente com
o INSS.
Na época do afastamento, a conta para
a aposentadoria resultou em rendimento de aproximadamente 80%
do seu último salário. De acordo com os cálculos feitos por
sua advogada, se tiver sucesso na ação de desaposentadoria,
ela pode recuperar os 20% perdidos, ficando com o benefício
bem próximo do salário integral da época da aposentadoria.
“Estou buscando um rendimento maior. Os salários hoje estão
pequenos, se eu vivesse só da Previdência certamente teria
que baixar o meu padrão de vida. Quem se aposenta por idade
recebe o salário praticamente integral, estou tentando recuperar
este tempo perdido”, diz.
Análise
O especialista em previdência Renato Follador
afirma que as decisões favoráveis mais recentes do Judiciário
se basearam no fator previdenciário instituído em 1999 e na
Constituição. “Se de um lado o beneficiário não pode receber
mais do que contribuiu, o inverso também é verdadeiro, o critério
deve ser o mesmo. Toda a contribuição dá origem a uma reserva
que deve ser devolvida. O Estado não pode se apropriar das
contribuições excedentes”, avalia.
“Os técnicos da Previdência estão bravos,
mas terão que acatar. Só agora a Justiça está reconhecendo
o equívoco. Se o cidadão se aposenta dentro das regras e continua
obrigado a contribuir com a Previdência, isso não é mais contribuição,
é imposto. O que não se pode admitir é o segurado permanecer
contribuindo durante anos e anos sem poder usufruir de nenhum
benefício”, completa.
A decisão do STJ confirmou o direito do
segurado em renunciar à sua aposentadoria atual reaproveitando
o tempo extra de contribuição para melhorar seu benefício,
sem devolver os proventos já recebidos. Este último detalhe
ainda divide muitos juízes de primeiro grau.
Especialistas em direito previdenciário
admitem que é normal haver entendimentos diferentes quando
um assunto ainda é muito novo. Cleber Piacentini, do escritório
Parucker & Piacentini, atualmente divide as ações em duas categorias com chances de
sucesso distintas. Aquelas de valor inferior a 60 salários
mínimos (hoje R$ 30,6 mil) são analisadas pelo juizado especial,
que ultimamente tem negado os pedidos.
Já as ações de valores maiores são encaminhadas
à vara previdenciária e têm boas chances de terminar no STJ,
onde a tendência recente é favorável ao segurado. Piacentini
ressalta que a posição do STJ ainda não significa uma consolidação
do entendimento judiciário. “Mas sem dúvida é um grande passo
nesse sentido, e privilegia o direito do aposentado.”
O cálculo de desaposentadoria é rejeitado
pelas agências do INSS, o que gera dificuldades no trâmite
da matéria. De acordo com Piacentini, há juízes que extinguem
o processo antes mesmo de analisar o caso. “O raciocínio deles
é de que não podem dar continuidade ao processo se a parte
não fez o básico, que é dar entrada com pedido junto à Previdência.
O problema é que as agências da Previdência não dão entrada
nesse processo administrativo, então o único caminho é judicial”,
diz
fonte: Gazeta do Povo