Um
país baseado em direitos
A vida em sociedade está baseada em
direitos e deveres. Parece apenas um jogo de palavras, mas
não é, principalmente no Brasil, onde somos orientados pelos
direitos. Temos os direitos dos idosos, dos excluídos – e
aí estão muitos brasileiros, pois todos de alguma maneira
somos ou nos sentimos excluídos, sejam negros, índios ou
pobres. Temos os direitos das crianças, dos adolescentes,
dos portadores de necessidades especiais, direitos dos trabalhadores
sem-terra, dos empregados, das mulheres, direito do funcionário
público.
Essa cultura de direitos torna o Brasil
um país de muitos com direitos e poucos com deveres. E o
pior, faz parecer que uma lei social importante é esquecida,
a que diz que onde termina o direito individual começa o
coletivo, ou dito de outra maneira, onde termina o direito
de um e começa o do outro.
Assim, o professor tem o direito de
faltar ao trabalho para ir ao médico. E o direito dos alunos?
Onde termina o do professor e começa o do aluno? Onde está
o dever de ofício do professor? Será que não está no direito
do aluno de ter aula? Quem tem mais direito, o aluno ou o
professor? Os moradores têm o direito de protestar em função
de um acidente, mas fechar a rua extrapola o direito, pois
invade o direito das pessoas de ir e vir.
Hoje, vivemos um momento em que os
únicos que não têm direitos no Brasil são os patrões. Precisam
respeitar o seu funcionário sob pena de ser processado por
assédio moral. O patrão precisa respeitar os fiscais – que
são muitos –, mas pode ser tratado como suspeito, sempre
que recebe uma fiscalização.
E chamo de patrão qualquer função
de gerência. Veja o exemplo de um diretor de escola: como
professor, ele tem seus direitos de jornada, faltas e, às
vezes, mesmo que não esteja impossibilitado de trabalhar,
não percebe que sua falta vai extrair o direito dos outros.
Quando assume a direção ou coordenação da escola, o professor
percebe a grande mudança que precisa fazer, pois mudou de
lado e passa a perceber a diferença entre o direito individual
e o coletivo.
E o que dizer da forma como estamos
educando nossas crianças e adolescentes em relação aos direitos
que elas possuem? O estatuto define que elas nada podem,
a não ser estudar. Com a escola em meio período, a execução
dos direitos das crianças e adolescentes vira um grande problema
para as famílias. Afinal, cada vez mais os pais precisam
trabalhar. E o que fazer com os filhos? Nas periferias das
cidades brasileiras, vemos uma enorme quantidade de crianças
e adolescentes pelas ruas, esquinas, lanchonetes. Essa visão
não é percebida em nenhum país desenvolvido. Qual é a visão
que estamos transferindo às nossas crianças? Qual é o dever
deles? Os direitos eles sabem e não aprenderam sozinhos.
Os adultos ensinaram e a escola em meio período deixa muito
a desejar.
A mudança social que pretendemos passa
necessariamente pela conquista dos direitos individuais,
sem esquecer que temos os nossos deveres e o principal, especialmente
dos adultos de hoje, é o de ensinar os deveres para a próxima
geração. Caso contrário, estamos tornando a vida em sociedade
muito complicada, pois não é possível que todos tenham só
direitos. Precisamos equilibrar, deveres e direitos, mais
ainda, precisamos dar mais direitos para quem está com seus
deveres em dia.
Ademar Batista Pereira é presidente
do Sindicato das Escolas Particulares do Paraná (Sinepe-PR)
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