MUDANÇAS
NA PREVIDÊNCIA
Fator da discórdia
Petistas tentam articular proposta de consenso para restringir
o Fator Previdenciário e melhorar regras de acesso à aposentadoria
com benefício integral
Governo e Câmara dos Deputados estão em contagem regressiva
para fechar ainda em abril uma proposta consensual de mudanças
nas regras de acesso à aposentadoria no Brasil. A solução,
negociada com as centrais sindicais, pode solucionar um impasse
histórico no PT. A ideia é criar um mecanismo paralelo ao
fator previdenciário, que facilite o recebimento do benefício
integral aos trabalhadores, mas não aumente o rombo da Previdência
Social.
O novo texto está sendo discutido na Comissão de Finanças
da Câmara e deve ficar pronto dia 21. A expectativa é que
ele possa ser votado em plenário no primeiro semestre, antes
de ser encaminhado ao Senado. Em uma previsão otimista e com
intervenção do governo, ele pode ser totalmente aprovado em
2009 e vigorar no ano que vem.
A proposta negociada passa por uma conta simples, que suaviza
os efeitos do fator previdenciário (veja infográfico acima).
Consiste na soma dos anos de idade do contribuinte na data
da aposentadoria, mais os anos de contribuição.
Pela ideia inicial, que tem o aval do Palácio do Planalto,
o benefício integral para as mulheres estaria garantido quando
essa adição atingisse 85. E para os homens, quando o número
chegasse a 95. As alterações atingiriam as pessoas que ainda
vão se aposentar, mas há também a possibilidade de quem já
se aposentou ter o benefício revisado a partir da adoção do
novo sistema de cálculo.
A regra 85/95 agrada parcialmente a líderes de sindicatos,
que já pediram o rebaixamento do teto para 80/90. A fórmula,
porém, parece o único caminho viável até o momento para desatar
um nó que remonta a 1999, quando o governo Fernando Henrique
Cardoso (PSDB) conseguiu aprovar a Lei 9.876, que criou o
Fator.
O índice combina a idade do contribuinte ao parar de trabalhar,
o tempo de contribuição e a expectativa de sobrevida no momento
da aposentadoria – dado que muda de acordo com estimativas
anuais feitas pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
(IBGE).
A mudança diminuiu em até 30% o valor das aposentadorias.
Por outro lado, também reduziu em R$ 10 bilhões o déficit
previdenciário ao longo dos últimos dez anos. Na época, o
PT se posicionou radicalmente contra o fator e chegou a recorrer,
sem sucesso, ao Supremo Tribunal Federal (STF).
Dilema petista
Ao assumir a Presidência da República, porém, a situação mudou
dentro do partido. Nos primeiros seis anos de governo Lula
não houve acordo para extinguir o fator, antiga bandeira ideológica
de contraposição ao PSDB. A negociação só avançou nos últimos
três meses e confronta três petistas do primeiro escalão da
legenda em Brasília – o ministro da Previdência, José Pimentel,
do Ceará; o senador Paulo Paim e o deputado Pepe Vargas, ambos
do Rio Grande do Sul.
Metalúrgico e sindicalista como Lula, Paim construiu grande
parte da carreira parlamentar com projetos de interesse dos
aposentados e conseguiu aprovar há um ano, no Senado, o Projeto
de Lei 3.299/08, que acaba com o fator. “Luto contra algo
inadmissível para todos os trabalhadores. Ninguém pode contribuir
por décadas para a Previdência e depois ter o benefício reduzido
em 35%, 40%”, resume.
O texto de Paim também prevê que o cálculo do benefício seja
feito a partir da média das últimas 36 contribuições do trabalhador.
A regra atual leva em consideração uma média de 80% das maiores
contribuições, descartando-se as 20% mais baixas. Nesse aspecto,
a sugestão de Paim desagrada até as centrais sindicais, pois
permitiria que empresários e profissionais liberais passassem
32 anos contribuindo com base em um salário mínimo e nos últimos
três anos pulassem para o teto.
Graças a essa conta e à simples extinção do fator, o governo
já deixou claro que terá de vetar o projeto, caso ele seja
aprovado na Câmara como passou no Senado. Na Comissão de Finanças
da Casa, o relator é Pepe Vargas. Partiu dele a busca por
um consenso que evite o provável veto do Palácio do Planalto.
“Se o governo vetar, não tem mais volta, a situação dos trabalhadores
continua como está. Vamos pagar para ver?”, questiona.
Consenso
Vargas é médico e fez carreira na própria área como funcionário
do Sindicato dos Metalúrgicos de Caxias do Sul. Segundo ele,
é preciso que os líderes sindicais entendam que a situação
de hoje é totalmente diferente de 1999. “Estamos em um momento
em que o governo não quer retirar direitos dos trabalhadores.
Os sindicatos não estão mais na defensiva, é hora de repor
parte do que foi retirado lá atrás.”
O deputado organizou na semana passada duas audiências públicas
para debater as propostas. Na primeira, com representantes
das principais centrais sindicais, ouviu críticas, mas conseguiu
uma sinalização de que há margem de negociação ao menos com
a Força Sindical e a Central Única dos Trabalhadores. Além
de reduzir a fórmula para 80/90, eles reivindicaram que o
cálculo da contribuição leve em consideração apenas 60% das
maiores contribuições – e não 80%.
Na segunda, com especialistas de órgãos como o Instituto de
Pesquisa Econômica Aplicada e o IBGE, recebeu um bombardeio
contra soluções que encareçam as aposentadorias. “Vejo um
futuro sombrio para os nossos filhos se isso acontecer”, destacou
o chefe do Departamento de Risco de Mercado do Banco Nacional
de Desenvolvimento Econômico e Social, Fabio Giambiagi. Estima-se
que a simples extinção do Fator aumente as despesas em até
R$ 40 bilhões.
O ciclo de debates será encerrado na terça-feira, quando o
ministro Pimentel participará da última audiência. Depois
disso, Vargas levará as propostas debatidas ao governo e checará
a viabilidade de cada uma. O relatório, inicialmente previsto
para ficar pronto no dia 16, deve ser apresentado uma semana
depois. Se as mudanças forem aprovadas, o texto volta ao Senado.
“Queremos resolver a questão na Câmara pelo menos até o primeiro
semestre. No Senado, é outra história.”
fonte: Gazeta do Povo
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